segunda-feira, 30 de julho de 2012

O Outro Lado Da Noite




Se pudesse escolher, provavelmente não veria a menor graça naquela mulher. Mas Letícia era intensa como uma festa: uma alegoria das suas melhores lembranças. Com ela recordava o menino que deixara escapar da alma. 

No momento em que o telefone tocou, às duas horas da madrugada, não conseguiu conter o sorriso. Do outro lado da linha, a voz dela:

— Quero conversar.

— Tenho alguma opção além desta?

Ela riu antes de admitir: 

— Você sabe a resposta.

— Só não digo até quando. 

— Eu sempre estou por um triz contigo. E sem rede de segurança. 

— Isto é um pedido?

— Nunca peço nada.

Era verdade. Letícia não pedia. Exigente e fora de controle como uma criança insuportável que acredita ser o umbigo do mundo. E nada poderia atraí-lo mais. Por isso a mantinha a uma distância segura: um milímetro da beira do abismo.

— Faça isso agora. Peça uma coisa cara.

— Diamantes. 

— Desconheço o termo.

— Deve ser porque sou a única coisa brilhante em sua vida.

— Minha luz.

— Acende o abajur. 

E os dois sorriram, ao mesmo tempo, como quem coloca entre parênteses tantas noites solitárias.


(*) Imagem: Google

9 comentários:

  1. esta é uma relação sadia,leve e feliz...
    é só querer pra ser assim!
    bjs

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  2. Você construiu um diálogo muito interessante entre os personagens. Curti!

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  3. "...Uma distância segura: um milímetro da beira do abismo."
    Instigante. Inteligente. Excelente!

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  4. "...A uma distância segura: um milímetro da beira do abismo".
    Instigante. Inteligente. Excelente!

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  5. instigante como disse a Helena! a alma procura abismos para se abastecer do intenso! beijos

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  6. O lado escuro da lua,
    o outro lado da rua
    denso, perigoso, bem
    diferente do primeiro
    conto. Poderoso, bjs.

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